segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Pequenas notas burocráticas

A alteração de qualquer elemento estrutural de uma casa, incluindo, na fachada, a mudança de cor carece de um pedido de licenciamento. Uma vez que a intervenção até à data constitui uma recuperação do edifício original, apenas foi necessário um aviso prévio de obra à câmara, que implica a fiscalização da obra para aferir a conformidade ao registo predial existente. O aviso possibilita o acesso a políticas de incentivo à recuperação na denominada ZIP (Zona de Intervenção Prioritária da baixa), incluindo isenções do IMI (Imposto Municipal sobre Imóveis) e do IMT (Imposto Municipal de Transacções).
Até agora, apenas a parte relativa ao saneamento implicou um pedido de licenciamento junto da empresa municipal Águas do Porto (o que pode também protelar outras intervenções).
O projecto da casa prevê ainda a adaptação para garagem da antiga loja existente no piso térreo, o que implicará a remoção de um pilar e subsequente montagem de uma porta de largura equivalente às duas antigas entradas (que correspondem também a dois números na rua). Essa intervenção carece de um pedido de licenciamento específico que será submetido a seu tempo.
Entretanto, advogados, um número difícil de estimar de funcionários públicos e vários cidadãos convocados a dar o seu testemunho gastam tempo precioso de vida e dinheiro público para deliberar sobre o papel de duas chapas de zinco enferrujado e amolgado num canto de um logradouro devoluto.
Enquanto o monstro burocrático engole as democracias no mundo ocidental, deglutindo pelo caminho a voz do cidadão, a obra desacelera a caminho do primeiro aniversário.

sábado, 19 de fevereiro de 2011

Pezinhos de lã

O processo de afagamento dos soalhos foi iniciado. Como de costume, começaram pelo piso superior e foi-nos pedido para, no caso de querermos ver o trabalho (ainda sem a última camada de verniz), entrarmos com o cuidado que o título do post exprime tão bem.

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Pêras rochas e profundos carmesins

A cor é uma ficção gerada pela luz sobre a matéria. A sua leitura varia de acordo com a infinitude de possibilidades criadas pelo cruzamento entre essas duas variáveis (a que se junta, ainda, a competência da fonte ocular). Resultado? Após uma demão, a primeira opção para uma fachada (no cartão horizontal) pode revelar-se flagrantemente desajustada. Felizmente, a maleabilidade do julgamento humano é (quase) tão diversificada como a paleta de tonalidades da CIN, pelo que, após uma pequena tertúlia cromática, a decisão recaiu sobre o discreto mas distinto 'pêra rocha' (no cartão vertical), que vai casar muito bem, esperamos, com o tom mais 'afirmativo' das madeiras e do varandim.

domingo, 13 de fevereiro de 2011

Bidé

Invenção francesa do século XVII, aparentemente devemos a sua existência ao pedido de uma rainha, que clamava por um dispositivo que permitindo manter a higiene das partes íntimas, se adaptasse harmoniosamente às curvas do seu corpo régio. Com muitas variações, chegou aos nossos dias em diferentes formatos e com hidráulicas variáveis. Este é um dos modelos clássicos, que adorna desde esta semana uma das casas de banho.

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

A história das coisas

Um objecto pode conter toda a história do mundo: onde e de que forma se descobriram e fabricaram as suas matérias, como se chegou à depuração dos seus motivos, qual a economia de transacções que o trouxe de um lado para outro do planeta, e ainda, a sua finalidade, inaugurada ao primeiro uso. Tome-se este tapete, excepção à política de contenção que tentamos sem sucesso aplicar face à expectativa da mudança: que mãos dedicadas, curtidas pelo Sol e pelo vida num país do Médio Oriente, poderiam adivinhar que o seu destino seria o quarto de dois ganapos numa casa antiga deste velho ancoradouro do norte de Portugal?

domingo, 6 de fevereiro de 2011

A propósito de portas e fechaduras

I.
Eu nunca gostei de portas, sempre as vi como
um grosseiro despotismo. Não percebia por
que razão davam passagem a uns e outros não.
Rebelei-me contra elas, tornei-me arrombador.
Decidido a contestar os seus desígnios, passei
os melhores anos da minha juventude a estudar
o idioma das fechaduras. Aos poucos, alcancei
uma secreta mestria: nenhuma resistia à sedução
dos meus arames. As portas franqueadas, e não
o que atrás delas se defende, procurava. Poucas
vezes roubei. Esta alegria me bastava - introduzir
desordem na composta segurança duma casa.
Agora que penso nisso, acho que havia algo
de bárbaro nessa minha obsessão por destruir
a ilusória placidez das fortalezas, os escudos
da propriedade, da suficiência. Porta atrás
de porta, a minha vida passou. Até chegar aqui,
a este lugar indistinto. Também nele há uma porta.
Não me seria difícil arrombá-la. Não fosse dar-se
o caso (e esse é o castigo da minha soberba)
de não saber se estou no céu ou no inferno.


in
"Erros Individuais", de José Miguel Silva

Espelhos

Outro belo trabalho de marcenaria, já aplicado em todas as fechaduras. Ainda a definir: pintar da cor das portas ou simplesmente envernizar e manter. Bitaites?

Chapa ondulada

Pormenores da chapa ondulada, antes e depois de pintadas. O efeito é quente, permitindo equilibrar a paleta de toda a fachada, particularmente no revestimento do pequeno 'torreão' que se destaca no segundo piso.